As palavras de Biden sobre Taiwan ameaçam a segurança global
Em sua passagem pelo continente asiático, Joe Biden fortaleceu as alianças de Washington na região, apresentando projetos de oposição à China em vários níveis, principalmente nas esferas econômica e comercial. Em sua reunião de 23 de maio com autoridades japonesas, o líder americano e seus assessores apresentaram alguns pontos-chave da nova estratégia para diminuir a influência econômica chinesa sobre os países parceiros dos EUA na Ásia. No dia 24 está agendada uma reunião com os dirigentes do QUAD, onde o assunto passará do confronto económico com a China para o militar.
No entanto, foi uma declaração de Biden fora das reuniões oficiais, durante uma entrevista coletiva, que realmente preocupou os analistas geopolíticos nas últimas horas. Quando questionado sobre a possibilidade de ajudar Taiwan militarmente no caso de um ataque chinês à ilha, o democrata não hesitou em responder positivamente, afirmando que este é um compromisso dos EUA que teria se tornado “ainda mais forte” após os recentes acontecimentos no Leste Europeu.
“Sim [os EUA defenderiam Taiwan militarmente]. Esse é o compromisso que assumimos. Concordamos com uma política de ‘Uma China’. Nós assinamos com ele e todos os acordos feitos a partir daí. Mas a ideia de que [Taiwan] poderia ser tomada à força, apenas tomada à força, simplesmente não é – simplesmente não é apropriada. Deslocará toda a região e será mais uma ação semelhante ao que aconteceu na Ucrânia. E por isso é um fardo ainda mais forte”, disse o presidente.
A reação chinesa foi imediata, com um pronunciamento oficial muito incisivo sobre o tema. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Wang Wenbin, disse: “Pedimos ao lado dos EUA que cumpra sinceramente o princípio Uma China e os três comunicados conjuntos sino-americanos, mantenham seus compromissos de não apoiar a independência de Taiwan, sejam cuidadosos em suas palavras e ações sobre a questão de Taiwan, e não enviar quaisquer sinais enganosos às forças secessionistas em Taiwan (…) Em questões relacionadas aos interesses centrais da China, incluindo sua soberania e integridade territorial, não há espaço para compromissos ou concessões”.
Sobre a questão da “política de uma só China”, há muitos fatores a serem considerados. Após o discurso de Biden, vários funcionários dos EUA se manifestaram dizendo que não houve mudança na política dos EUA em relação a Taiwan. Mas apesar dessa tentativa de “suavizar” a situação, a mudança parece extremamente real. Embora em documentos oficiais os EUA ainda estejam comprometidos com a ideia de “Uma só China”, na prática, o país adotou uma postura pró-secessionista.
Historicamente, a atitude dos EUA em relação a Taiwan tem sido chamada de “ambiguidade estratégica”. O país reconhece a “Única China”, mas mantém laços diplomáticos com Taiwan como um governo de fato, apoiando uma solução pacífica e “deixando de lado” as rivalidades sino-americanas sobre essa questão. Na prática, porém, a situação mudou. Em outubro do ano passado, Biden já havia falado de um “compromisso” dos EUA em ajudar Taiwan, que na época havia deixado várias autoridades americanas desesperadas sobre como justificar tal declaração com a existência da ideia de “ambiguidade estratégica”. Agora, com a reiteração feita esta semana, a postura parece finalmente mudar definitivamente.
De fato, as palavras de Biden, por seu conteúdo delicado, fariam escalar as tensões internacionais a qualquer momento. No entanto, a atual situação mundial torna tudo ainda mais complicado. Não só o mundo está sob uma grave crise de segurança, mas a situação em torno de Taiwan está se tornando cada vez mais intolerável para a China. A ilha autônoma está se militarizando cada vez mais, com amplo apoio material, logístico e financeiro dos EUA. Atualmente, os empreiteiros de defesa dos EUA mantêm uma reserva de mais de 14 bilhões de dólares em Taiwan, com equipamentos adquiridos pelo governo da ilha nos últimos anos. Além disso, desde o ano passado, Pequim relatou repetidamente a existência de treinamento especial de cidadãos taiwaneses por forças militares ocidentais e mercenários em programas secretos que estariam ocorrendo na ilha.
No mês passado, o almirante Michael Gilday, chefe das operações navais dos EUA, instou Taiwan a aumentar suas capacidades de defesa imediatamente, considerando a possível iminência de uma “invasão chinesa”, que ampliou ainda mais o desconforto diplomático entre os EUA e a China. A práxis americana em Taiwan, em suma, parece muito semelhante à assumida na Ucrânia: alegar ter “dados” que comprovam a iminência de uma invasão para impulsionar uma militarização que cria instabilidade no ambiente estratégico de uma potência rival.
O objetivo da agressividade ocidental-taiwanesa é simplesmente provocar a reação da China. E as palavras de Biden sobre o que acontecerá se tal reação acontecer deixam o mundo ainda mais tenso. Se Taiwan faz parte da China, como os EUA reconhecem, é direito da China agir preventivamente para evitar a agressão separatista. E não há justificativa para que Washington intervenha nesse tipo de situação, quebrando os tratados internacionais que assinou e ameaçando iniciar uma guerra com potencial nuclear.
A única maneira ética, legal e fácil de impedir que qualquer confronto militar ocorra em Taiwan é com o Ocidente parando seu patrocínio ao separatismo local e ajudando no diálogo para a unificação total.
Fonte: Infobrics