Análise do 1º Turno das Eleições Parlamentares Francesas

02.07.2024
Na França de Macron, um barril de pólvora de instabilidades advindas de várias crises simultâneas, todas elas agravadas pela política externa megalomaníaca do Estado francês, o resultado das eleições parlamentares foi a vitória dos patriotas do Reagrupamento Nacional.

Na França de Macron, um barril de pólvora de instabilidades advindas de várias crises simultâneas, todas elas agravadas pela política externa megalomaníaca do Estado francês, o resultado das eleições parlamentares foi a vitória dos patriotas do Reagrupamento Nacional.

Os mesmos parecem estar levando aproximadamente 33% dos votos, com a "frente popular" da esquerda liberal-progressista levando 28%, os macronistas levando 21% e os neoconservadores levando 6%. Mas como as eleições legislativas na França são conforme um modelo "distrital", em que incide um elemento majoritário local, só será possível ter certeza do resultado após o 2º turno, a ser realizado em 7 de julho.

Não se deve esperar qualquer mudança radical nos rumos da França, especialmente no que concerne a política externa e as questões de Estado, a partir das eleições. E isso por um motivo simples. O resultado dessa eleição deve conduzir à escolha de um primeiro-ministro, o qual, na França, lida com questões de governo e não de Estado.

Ademais, o Presidente da França é muito mais poderoso que os Executivos da maioria das repúblicas. Não obstante, uma Assembleia que será, aparentemente, menos liberal e menos progressista, mesmo que o primeiro-ministro não seja do RN, naturalmente forçará o próximo governo a inúmeros compromissos, impondo certas travas aos projetos mais delirantes de Macron.

Deve-se descartar a possibilidade de uma ascensão de Jordan Bardella ao cargo de primeiro-ministro. Não é muito provável que o RN alcance a maioria dos assentos, e os outros partidos tendem a topar qualquer aliança para evitar um governo com primeiro-ministro do RN. Ou seja, apesar de todo discurso "antissistema", Melenchon e os seus são, ao final do dia, "macronistas a contragosto".

As eleições francesas tendem a ser interessantes para analistas porque o instituto IPSOS sempre produz uma análise sociológica bem completa do resultado eleitoral. E os dessas eleições confirmam os resultados de eleições anteriores.

Em geral, os habitantes de grandes cidades (+ 200 mil hab.) tendem a ser liberal-progressistas ou macronistas, enquanto os habitantes de cidades pequenas e médias votam nos patriotas.

O voto patriótico tende a ser o voto dos cidadãos inconformados com Macron. O voto macronista é o dos satisfeitos com o governo Macron. O voto na esquerda liberal é o dos que estão mais ou menos insatisfeitos com Macron.

A divisão de gênero já praticamente deixou de existir. Tanto homens quanto mulheres votam no RN, e o vácuo etário também está diminuindo. Em 2022, 18% dos franceses entre 18 e 34 anos votaram RN, agora são 33% dos eleitores dessa faixa etária, enquanto os eleitores dessa mesma faixa etária dos partidos dessa mesma esquerda eco-liberal-progressista caíram de 48% para 43%.

No que concerne profissão, a esquerda liberal continua sendo a preferência de gerentes, profissionais liberais e funcionários públicos, enquanto os patriotas continuam sendo a preferência dos desempregados, dos operários de fábrica e dos assalariados em geral. O RN tomou o voto dos funcionários de escritório ("colarinho branco") da esquerda, e tomou o voto dos aposentados de baixa renda dos macronistas (que preservaram os aposentados abastados), consequência da Reforma da Previdência de Macron.

Socialmente, o voto patriótico é o dos "descamisados", do proletariado, do campesinato e da pequena burguesia. O macronismo e a esquerda liberal dividem o voto da elite. Nessa eleição, a IPSOS acrescentou um quesito sobre poupança, de modo que é possível descobrir que o eleitorado macronista é aquele para o qual sobra boa parte do salário ao final do mês. O eleitorado liberal-esquerdista é o que consegue poupar uma certa quantia, enquanto o eleitorado patriótico é o de cidadãos endividados ou que apenas consegue pagar as contas, e mais nada.

Um detalhe curioso da análise sociológica é que 10% daqueles que votaram em Melenchon nas últimas eleições presidenciais passou para o campo eleitoral patriótico e votou agora no partido de Le Pen. Ademais, 6% dos filiados ao Partido Comunista Francês também votou no Reagrupamento Nacional.

De um modo geral, na França vemos as mesmas dinâmicas eleitorais típicas da crise do liberalismo político e da pós-modernidade, mas radicalizadas pelo problema da imigração em massa, pela ameaça de guerra civil, pelo aumento do custo de vida, por reformas neoliberais impopulares, pela imposição forçada do wokismo e pela política externa desastrada de Macron.

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