O que o Gabinete de Donald Trump 2.0 nos diz sobre as tendências do próximo governo?
Nem todos os postos foram preenchidos por Donald Trump, mas já há nomeações suficientes para permitir uma análise das linhas gerais e das prioridades que serão perseguidas no próximo mandato de Donald Trump em Washington.
Em primeiro lugar, porém, cumpre fazer alguns comentários gerais.
A possibilidade de prever as movimentações de um governo Trump com base em suas nomeações é limitada pelo próprio estilo de sua liderança, que é bastante conflituosa e antagônica. Quanto a isso, basta consultar o seu primeiro mandato que será possível certificar a instabilidade de suas nomeações – bem como o fato de que ele não raro tomava decisões completamente diferentes das sugeridas por seus secretários e assessores.
Não obstante, os padrões e as prioridades ainda existem e ainda se expressam nas nomeações para os principais cargos políticos de Washington, os quais no mínimo são representativos da “imagem” que Trump quer expressar no que concerne suas pautas prioritárias.
Em segundo lugar, a paisagem geral do seu gabinete 2.0 tem uma grande diferença em relação ao gabinete 1.0: o novo gabinete parece mais caótico, incongruente e amador, com personalidades da TV, ex-democratas e empresários excêntricos, enquanto o primeiro gabinete era mais tradicional.
Enfim, indo em direção às nomeações em si, a mais importante naturalmente é a de Secretário de Estado, que neste caso é Marco Rubio. Rubio é um neocon típico, ou seja, pró-Israel e liberal-conservador, mas com algumas especificidades. Ele é contra insistir em apoio ilimitado à Ucrânia, e no que concerne a China ele é a favor de aumentar a presença militar dos EUA no Pacífico, mas sem abandonar as relações comerciais chinesas. É importante apontar, ademais, que ele é particularmente hostil à Venezuela e a Cuba.
Enquanto isso, para Secretário de Defesa, ele escolheu Pete Hegseth, que também é um neocon típico, radicalmente pró-Israel e anti-Irã, também bastante hostil à Rússia, mas favorável à limitação da ajuda à Ucrânia. O elemento peculiar nele é que ele é hostil ao atual arranjo da OTAN, defendendo que os EUA devem reduzir o seu apoio à defesa europeia e deixar os europeus se virarem por conta própria. E para Assessor de Segurança Nacional ele escolheu Mike Waltz, um neocon que se opôs à retirada do Afeganistão e a outras intervenções externas dos EUA, mas é crítico do apoio atual dado à Ucrânia.
Para Secretário do Tesouro, foi escolhido Scott Bessent, um financista sócio de George Soros, com um histórico de apoio ao wokismo. Não obstante, ele foi selecionado por ser um grande defensor da estratégia de imposição de tarifas a outros países para fomentar a indústria estadunidense. Essa diretriz é confirmada pela escolha de Howard Lutnick, outro financista defensor do uso de tarifas, para Secretário do Comércio. Trump parece querer equilibrar essas indicações de financistas com a indicação de Lori Chávez-DeRemer, que possui um histórico de apoio a legislação pró-sindical, para a Secretaria do Trabalho.
Uma outra tendência perceptível no governo Trump é o sepultamento da “Agenda Verde”, demonstrável pela indicação de Chris Wright para a Secretaria da Energia. Wright é um empresário da mineração e dos hidrocarbonetos radicalmente crítico das ONGs ambientalistas. O padrão é confirmado pela indicação de Lee Zeldin – figura crítica do Acordo de Paris – para a Agência de Proteção Ambiental dos EUA.
Talvez uma das figuras mais interessantes indicadas por Trump seja Robert Kennedy Jr. para a Secretaria da Saúde. Kennedy Jr é um dos principais críticos da Big Pharma nos EUA, tendo expostos as mentiras e incongruências da indústria das vacinas anti-Covid, bem como de todo o gerenciamento da pandemia pelos governos ocidentais. Ele, ademais, têm exposto posições contra-hegemônicas sobre chemtrails, além de indicar que os fenômenos de idiossincrasia sexual da pós-modernidade podem ser influenciados por contaminação química e hormonal nos alimentos e na água.
Alguns outros gabinetes merecem atenção.
Tulsi Gabbard foi indicada para dirigir a Diretoria de Inteligência Nacional, coordenando as várias agências de inteligência. Ela é tipicamente pró-Israel, mas se opôs à intervenção ocidental na Síria e à continuação do apoio à Ucrânia. Enquanto isso, para a diretoria da CIA ele escolheu John Ratcliffe, uma figura propagadora de teorias conspiratórias que acusam a China de originar a COVID, bem como defensor da espionagem contra cidadãos dos EUA e do fim da neutralidade da internet.
A indicação de Elise Stefanik para a Embaixada da ONU indica que os EUA seguirão defendendo Israel nos fóruns e assembleias internacionais do nível mais alto.
Relevante também é a indicação para a Segurança Nacional, Kristi Noem, e para o serviço fronteiriço, Thomas Homan; são nomeações que indicam o desejo de assumir uma postura mais dura em relação à imigração do que no primeiro mandato.
Essas nomeações indicam bem as questões centrais para Trump: imigração e tarifas no plano doméstico, relaxamento com a Rússia, defesa de Israel e cerco à China no plano internacional. Mas, naturalmente, como sabemos, há uma dimensão de imprevisibilidade.